O abuso de drogas

Hoje resolvi abordar o tema do uso de drogas e a relação que o sujeito estabelece com esta que mostra um modo peculiar em resposta à demanda ao grande Outro, frente à castração. Como dizia Freud, a ingestão da droga é uma forma de ‘construção auxiliar’, uma bengala (hilfsconstruktionen) capaz de amenizar o mal-estar.
Para entendermos melhor essa questão é preciso retomar o raciocínio de Freud quando conceitua sobre a Pulsão, em 1905, nos “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, mostrando seu caráter dual: pulsão de autoconservação e a sexualidade. Mais tarde percebe uma tendência a um estado anterior – inorgânico – a pulsão de morte, reformulando toda a teoria das pulsões. No lugar de uma oposição entre as pulsões do eu e as pulsões sexuais, substitui pela oposição entre as pulsões de vida e as pulsões de morte.
Caminhando um pouco mais, Freud diz que ‘o princípio do prazer parece na realidade servir às pulsões de morte’ uma forma de entender melhor a “compulsão à repetição” que leva o sujeito à natureza mais íntima das pulsões. Lacan nos mostra isso melhor quando articula as representações da pulsão como ‘borda’ do corpo onde estão as zonas erógenas, fontes da pulsão sexual e assim a um princípio de repetição, pois contorna o objeto sem jamais satisfazer-se.
Para entendermos, na pulsão oral, por exemplo, o que satisfaz o bebê não é apenas o alimento, mas o prazer sentido na boca ao sugar o alimento. A psicanálise postula que o sujeito se constitui a partir de um ‘furo’. O que para Freud é o objeto perdido, possibilitando o advento do desejo, insatisfeito.
O que se observa no toxicômano é que ele se empenha em evitar a castração, a falta, a ordem fálica. O sujeito busca na droga a satisfação não simplesmente pelo ato de drogar-se ou incorporar a substância ‘droga’ no organismo. Vai além disso, da satisfação da pulsão, o objeto de uma compulsão à repetição, que leva em consideração o desprazer também.
A dependência faz parte da constituição do sujeito e cada um encontra a seu modo como lidar com a falta e a angústia provocada por ela, grande motor para o gozo.
A droga produz uma ação no corpo provocando sensações corporais que ele nunca havia experimentado antes, que podem ser não apenas de prazer intenso, mas também de mal-estar. Estar dependente é estar sob o domínio de algo que é superior a ele, a droga.
FREUD em Mal-estar na Civilização apontava que o sujeito frente a sua incompletude fundante e na busca de sua felicidade perdida, encontraria nas drogas uma saída a fim de evitar o sofrimento, e o alívio propiciado pelas mesmas trazendo à tona a esperança de eliminar a divisão subjetiva, a incompletude do sujeito frente a sua falta. Nos anos de 1880, envolvido com suas experiências com a cocaína enquanto anestésico local, acabou deparando-se com a dimensão do hábito e do uso compulsivo da substância. Pode-se questionar se essa experiência de Freud com a cocaína, não seria sua primeira constatação de um para além do princípio do prazer. Em outras palavras, pode-se considerar que o sujeito procura a euforia, o bem-estar e depara-se com o terrível hábito, o aumento das doses e em conseqüência, a dependência.
O uso abusivo de drogas pode ser considerado como um protótipo da eleição do desejo que suprime a palavra e busca obturar a falta. O usuário só aceita e crê no desejo possível de ser obtido no próprio corpo, assegurado pela satisfação direta e imediata proporcionada pelos efeitos desta.
No último dia 23 de julho de 2011, a cantora Amy Winehouse nos deixou. Usuária de diversas drogas pesadas, usava a música para expressar muitos de seus momentos em vida. Apesar de sua música ‘Rehab’ simbolizar parte de sua vida e a dependência às drogas, esta não conseguiu apaziguar seu sofrimento. É mais uma que a morte falou mais do que a vida, cheia de talento que se diferenciou com uma qualidade e estilo inigualáveis. Amy Winehouse deixa um desejo de quero mais com sua falta.

Comentários

  1. Ressalto no entanto que Amy Winehouse não foi uma drogada qualquer, ela foi um talento absurdo, que infelizmente se perdeu neste caminho, sei que ela não é um exemplo a ser seguido, mas realmetne acho de péssimo gosto umas piadinhas que andam rolando pela internet à respeito da dependência dela pelas drogas, então pra todos que se acham mega superiores porque não usam drogas, não se esqueçam que álcool também é droga e mata...

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  2. Concordo plenamente com seu comentário, Vinícius. Infelizmente parece que as pessoas esquecem do que foi o sujeito, seus talentos, sua vida, enfocando somente em seus defeitos.
    No meu caso específico, procurei abordar um tema que sempre trás questionamentos que é esse uso descontrolado do sujeito pelas drogas, que leva a uma compulsão de morte.

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